sexta-feira, 25 de abril de 2014

O duelo

Eu e Edmund voltámos para dentro da caverna, onde Ben se encontrava com Peter, Lucy, Susan e Caspian. Por um lado, eu queria seguir o conselho de Edmund e fazer as pazes com Ben, mas o meu orgulho não me deixava.
-O duelo está marcado para amanhã - disse Edmund - é melhor a Susan e a Lucy se irem preparando para partirem para a floresta.
-Continuo a achar que isto não é uma boa ideia – resmungou Trumpkin, que apareceu entretanto.
-Não te preocupes, Trumpkin - disse Lucy – vai correr tudo bem assim que encontrarmos Aslan.
O nome do Grande Leão provocava em mim uma sensação quente e agradável, que me fazia lembrar os dias de Verão.
-Entretanto, eu tenho de me ir preparar para o duelo com o Miraz – declarou Peter e depois olhou para o irmão – Edmund?
-Claro, treino contigo – acedeu ele – mas não esperes que te facilite a vida.
Saíram os dois para uma sala vazia e Caspian e Ben foram ter com eles, enquanto Trumpkin regressou para junto de outros anões.
-Lamento que tu e o Ben se tenham chateado por causa do Edmund – disse Susan.
-Não foi a primeira vez – desabafei.
-Nós sabemos – disse Lucy muito depressa e depois olhou para Susan como se tivesse dito algo que não devia.
-Como? – perguntei.
-Bem… - começou Susan – na escola… eles estavam sempre a lutar por causa de ti. Pelo menos no princípio era por causa de ti, mas depois começaram a lutar por tudo e por nada.
-Porque raio é que eles iriam lutar por minha causa? – questionei.
-Tu eras a rapariga de quem te falei, Melanie – disse uma voz atrás dela. Virei-me, olhando para Ben – aquela porque eu e o Edmund estávamos sempre a lutar. Eu disse-te que não olhava para ela da mesma maneira que ele.
Abanei a cabeça, confusa, enquanto pensava na conversa que tivera com Ben. Este dissera-me de facto, que eles tinham começado as brigas devido a uma rapariga. “Mas, sabes, as maiores lutas eram aquelas que começavam por eu o ter apanhado a olhar para… a rapariga.”, revelara-me Ben. E logo a seguir declarara que não olhava para a rapariga da mesma forma que Edmund a olhava. Seria possível que essa rapariga fosse eu? Fazia sentido, mas não conseguia acreditar… quer dizer, eu e Edmund mal nos falávamos naquela altura… e no entanto, Ben apanhara-o a olhar para mim?
-Eu lembro-me da nossa primeira luta – continuou Ben – ele estava a observar-te a ler, fora dos portões da vossa escola, enquanto esperava por Lucy.
-E isso foi suficiente para lhe bateres? – inquiri, não conseguindo perceber se me sentia mais irritada pelo facto de Ben começar a brigar por coisas insignificantes se pelo facto de nunca ter percebido que era a razão das lutas deles e de nunca me ter apercebido de que Edmund me observava – ao menos estás arrependido?
Ben não respondeu, limitando-se a cravar o olhar no chão. Abanei a cabeça e sai para fora da caverna, vendo as tendas que o exército de Miraz montara do outro lado do descampado.
-Rapazes – disse Lucy aproximando-se – resolvem sempre tudo a lutar.
-Sinto-me tão estúpida. Nunca percebi que era por minha causa, percebes? – comentei.
-Eu lembro-me que o Peter o costumava provocar – declarou Lucy – dizendo que ele não tinha coragem para ir falar contigo e isso.
-Então toda a gente sabia disto menos eu?
-Bom, nós não sabíamos exatamente o que é que o Edmund sentia por ti, mas para estar sempre a olhar para ti...
Permanecemos ambas caladas durante algum tempo, a observar o sol a pôr-se lentamente. Depois Lucy quebrou o silêncio:
-Tu também gostas dele, não gostas?
Fiquei calada. Não sabia o que responder. Lucy sorriu levemente. Eu sabia que ela interpretava o meu silêncio como um sim. E talvez o meu coração também. 

*


No dia seguinte era o duelo entre Peter e Miraz. De manhãzinha Lucy e Susan partiram no cavalo de Caspian para a floresta, em busca de Aslan. Entretanto, Peter e Miraz equiparam-se e à entrada da caverna uma multidão de narnianos aplaudia Peter. Olhei para Edmund, que seguiu Peter até às ruínas onde se daria o duelo. Ele olhou para mim. A poucos metros de mim encontrava-se Ben, e não sabia onde estava Caspian. Eu e o meu irmão estávamos ambos com a armadura posta, prontos para combater se fosse preciso.
-Ainda há tempo para a rendição - ouvi Miraz dizer a Peter.
-Esteja à vontade - replicou Peter.
-Quantos mais devem morrer pelo trono? - questionou Miraz.
-Apenas um! - exclamou Peter, pondo o capacete na cara e empunhando a espada. O som de espadas e de metais a bater era constante à medida que o duelo avançava. 


A certa altura Peter caiu ao chão e conseguiu por sorte desviar-se dos golpes de Miraz e quando finalmente se conseguiu levantar parecia ter deslocado o ombro. Em seguida ouviu-se o som de cascos e vindos da floresta apareceram Caspian e Susan montados no cavalo, sem sinais de Lucy. Então Caspian não conseguira evitar ir ter com elas à floresta.
-Sua alteza precisa de um descanso? - perguntou Miraz.
-Cinco minutos - pediu Peter.
-Três - indagou Miraz. Assim, Miraz dirigiu-se aos telmarinos e Peter a Edmund, Susan e Caspian.
-A Lucy? - perguntou ele a Susan e Caspian quando saíram do cavalo.
-Conseguiu avançar - disse Susan. Peter olhou para Caspian.
-Obrigado. 
-Tu estavas ocupado - respondeu Caspian, humilde. Trocaram mais algumas palavras e Susan correu de encontro aos narnianos, posicionando-se junto aos arqueiros, nomeadamente Trumpkin. Depois ouvi Peter dizer a Edmund:
-Estiveste sempre ao meu lado e eu nunca... - mas foi interrompido por Edmund, que conseguiu colocar o ombro de Peter de volta ao lugar.
-Deixa isso para depois - replicou Edmund.
Finalmente, acabou a pausa e Peter e Miraz voltaram ao círculo de ruínas. A luta recomeçou e Miraz atacou em força e em pouco tempo derrubou Peter, que se conseguiu levantar. Continuaram a lutar até Peter atingir Miraz numa perna, onde este já estava ferido. Miraz caiu de joelhos no chão, dizendo:
-Pausa!
-Peter, não é hora para cavalheirismos! - gritou Edmund. Peter nada fez e virou-se, mas Miraz levantou-se e preparou-se para atacar. Peter bloqueou-lhe o ataque e golpeou Miraz, que novamente caiu no chão de joelhos. Peter preparou o golpe fatal, mas hesitou. 
-Qual é o problema, rapaz? - instigou Miraz - és cobarde demais para tirar uma vida?
-Não me cabe a mim tirá-la - respondeu Peter, estendendo a espada a Caspian, que, também um pouco hesitante, avançou e pegou-lhe. Quando Caspian se preparava para golpear Miraz, este disse:
-Acho que me enganei. Talvez tu tenhas as qualidades de um rei telmarino, afinal. 
Gritando, Caspian avançou, espetando a espada mesmo em frente a Miraz, num tufo de relva. 
-Não igual a ti - disse ele - só quero devolver aos narnianos o reino deles.
Caspian virou-lhe costas e foi saudado pelos narnianos, que irromperam em festejos. Eu, no entanto, fixei o olhar num telmarino que se aproximou de Miraz e após uma breve troca de palavras entre os dois, o telmarino espetou uma seta em Miraz. Os narnianos interromperam os festejos e ficou tudo calado, vendo Miraz cair no chão, morto, até que o telmarino que lhe espetara com a seta berrou:
-Traição! Lançaram contra ele! Assassinaram o rei!
Peter, vendo que aquilo ia acabar mal, gritou aos narnianos:
-Preparem-se!
Olhei para Ben, vendo que a batalha ia começar. Ele assentiu levemente a cabeça, e soube que tínhamos feito as pazes. Os telmarinos começaram a lançar pedras através de catapultas para cima de nós. Muitos narnianos tinham ficado dentro da caverna por causa do plano, e de certeza que sentiram a terra estremecer. 
Finalmente, os telmarinos avançaram com os cavalos. Susan preparou os arqueiros e uma chuva de setas voou de encontro a eles. Sentia o meu coração a bater a mil quando desembainhei a minha espada. Caspian entrou dentro da caverna, fazendo sinal aos narnianos lá em baixo para golpearem os pilares de pedra, o que faria a terra desabar e os telmarinos caírem.



Assim foi, e alguns recuaram, mas outros começaram a levantar-se.
-Atacar! - gritou Peter e as minhas pernas começaram a mover-se sozinhas, impelindo-me para Edmund.
-Edmund! - chamei. Ele virou-se para trás, a espada na mão.
-Mantém-te a salvo - pedi. Ele sorriu.
-Tu também - disse ele. Percebi que não conseguia deixá-lo ir sem mais nada, lembrando-me da aflição com que ficara quando ele fora anunciar o duelo a Miraz. Por isso, não me importando com mais nada, aproximei-me e pousei os meus lábios nos dele. Após um segundo, ele correspondeu e o meu coração começou a bater ainda mais depressa. O beijo foi fugaz, mas intenso e apaixonado. Afastámo-nos, sorrimos, ele subiu para o seu cavalo e eu avancei para a batalha.

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